Ricardo Valez

segunda-feira, 15 de setembro de 2003

Lágrimas

Doem-me ainda estes olhos
Escorridos porque lágrimas
Vencidos porque almas
Rasgando a face por onde descem
E ardendo só por de onde vertem

Minha alma é coração, espírito porque sou
Flama por canção, rito a quem me dou
Mas não sou, apenas fui, nem dou apenas dei

Porque o que fui, fui e deixei de ser
E o que sou, sou livre, isento de regra e lei
Ora assim, vazia a alma, nua, mas voraz por arder.

Porque a despiste e a tomaste?
Porque vieste e a deixaste?
Porque a vestiste do teu ser
Se para fugir e a deixar morrer?

Pois e por que alma tomo, eu, a minha?
Qual morre, porque a chamas por voz vizinha,
Porque lhe roubas o sabor, porque a deixas nua,
Porque deixa de ser se por ser não for tua.

quinta-feira, 15 de maio de 2003

Poder e Solidão

Sou forte, grande, poderoso. Sou maior que muitos, se não que todos. Nenhum olho viu nem jamais virá tamanha grandeza e importância. Quando me olham, eu ofusco, quando não cego; sou terrível e único, como eu não há. Quando olho, queimo e deixo queimar, e não me importo que faça o mundo acabar.

Ma na minha grandiosidade, o mal não é tudo. Faço luz e vida pelo meu olhar, e mesmo quando me escondo, faço reflectir o meu brilhar e onde há travas faço ouvir o canto da esperança.

Assim é que é o meu poder, assim é que sou, sempre fui e sempre serei: poderoso como ninguém, elevado sobre os céus sou maior que muitos se não que todos.

Mas pelo meu poder, sou um só, sou único e só, ninguém suporta o meu fervor, ninguém suporta o meu calor. Nem a Lua me quer, sou simples Sol sem qualquer amor.

sexta-feira, 28 de março de 2003

Amarga Divina Dor

Para ti quero escrever, dizer e falar
Tantas fossem as palavras quantas pudesse cantar
Fazer o mundo florescer e o coração desabrochar
Fazer a gravidade cair e ao tempo enganar

E sinto cansado o coração e cada vez mais
Cem razões, sem saber quantas nem quais
Sinto o peso que esmaga cada desejo meu
Inexpressiva a voz de quem morre e não morreu

A saudade, nasce e irrompe durante a própria acção
A prosa, sinto-a pelo elo perdido e a sua canção
O brilho do meu olhar é vaticínio insípido e incolor
A previsão pelo teu é amarga divina dor

Por isto a falta do que vivo mas também do que não fiz
Porque outrora, visões da tua face e olhares de cem rubis
Reflexo agora, futuro de então desde cada a cada passo
Porque a luz é distante tanto quanto o brilho é baço

Agora repete-se a mágoa do fantasma do passado
Agora, consumida pelo dom mútuo que nos foi dado
Porque assim o somos e fomos, pois por natureza
Porque nos completámos, pela felicidade, na devassa tristeza.