Ricardo Valez

terça-feira, 29 de agosto de 2006

Chaga Incurável

Tempo… Por cada mês que passa e tem passado mais e maiores e não melhores são as palavras que escrevi e da mão se desenhou cada letra, cada palavra do coração. São-me as semanas contínuas, como silvas, espinhos que se cravam sem parar e nem parei e nem deixei eu de sofrer, pois por chorar enchi um mar sem pé e por Inverno de mim congelo esse mesmo mar num único temporal ferido e despido de qualquer Primavera ou Verão como que por eterna Queda de estação. Conto cada dia, conto cada minha dor e pela dor não sei quantos contei nem tampouco quantos vivi. Anseio, paranóico, a cada hora, como louco e como louco espero por nada, espero, vã esperança, por um encontro por acaso, mas forço toda e cada sorte e acaso que há, tenho e é em mim. Mesmo sem olhar vejo passarem minuto após minuto pois assim também lágrima após lágrima como relógio que acompanha o tempo sem ter noção do mesmo passar, e o ponteiro que se faz rodar como caem as águas da mágoa da alma como cada tempo que passa por minuto, porquanto dos meus olhos se fez foz viva da minha alma que se derramou incessante como o vento que sopra, o céu que não cai e o sangue que flúi e não pára senão para morrer. Apesar disto tudo, e maior que todos os meses, semanas, dias, horas e minutos foram cada segundo que se recusava a passar atrasando o tempo e prolongando o sentimento e a dor, maior que todo o tempo que me restou, porque cada segundo foi mais que um dia por morte como cada morte de cada parte do meu espírito foi por cada segundo, e cada segundo de mim foi por minuto, hora e mês que o tem vindo a ser.
Tempo… frio e cruel como agulha penetrante, como espelho sem reflexo ou língua sem paladar. Não pára, não espera e não regressa por ninguém. Imutável seja por que sonhar, querer ou desejar. Não se deixa mover seja por que padecer, não se deixa comover nem por saudade, esperança ou solidão. Deixa-se só acontecer inalterável seja por que gritar, clamor ou poder. Com o poder e força de tudo mudar, moldar e alterar, nunca se fez parar nem tem dó de quem se perde e para trás se deixa ficar. Passeia só em frente, de hoje para amanhã. Não lhe há passado, apenas deixa-se ser. Sem nunca se enervar mantém sempre o mesmo ritmo orgulhoso, impassível e indiferente. Sem nunca se entristecer ou alegrar não se perde por vaidade ou paixão nem tampouco por compaixão. Sem ódio ou amor deixa-se só imortal na imparcialidade do seu ser perverso e racional por infinita lógica irrefutável. Controlando o passar de tanto do que o rodeia. E tudo o rodeia, escravos do seu querer, somos nós… Sem réstia seja de que paixão, molda o bem em mal e o mal em bem, o bem em melhor e o mal em pior. Inconsciente da sua própria inércia molda o pior no melhor e o melhor no pior. Sem alma, espírito ou coração, deixa-se somente estar e ser pelo poder do seu passar.
Oh que tempo conto eu? Pois se o tempo não muda, como pode um tempo meu ser-me por sete tempos? Como pode um segundo ser tão doloroso? E como pode ser tão doloroso como a soma de todos os tempos? – Simples pois não pode. Não pode porque é a soma de todo o tempo que se faz em cada segundo que me passa por cada dor e mágoa e saudade… oh a saudade… quem me dera a mim o que perdi porque o que perdi era tudo, era tudo em mim, era cada segundo, minuto ou mês, cada pensar que ia pensando por cada tempo e por cada tempo cada segundo, enquanto pensava ainda por amor e não por mágoa, saudade e dor. Levar-me-ias tu a minha dor? Levar-me-ias tu esta dor assim como me levaste a minha cor? Assim como levaste a alegria que era minha, mas que era minha por ser por ti, antes que eu pudesse sequer imaginar esta elegia… assim como deixaste de ser e nem sei porque poder ou magia…? É que não compreendo como pode alguém fugir a este amor e viver senão como quem já alguma vez viveu, porque morreria eu se não o tivesse, e morro porque não o tenho. Mas deixo-me viver, por esta morte ainda inconsumpta, pelo sangue derramado e a mágoa que deixaste em mim para nada senão para saudade, memória e o ardor que arde como explosão do meu ser mas que implode por dentro no meu coração porque não tem mais por que explodir e nada tem senão a si mesmo para se consumir e consumir-se-á até a uma morte mais o venha buscar para poder renascer em quem não sou mais nem por quem sou.
Tomara eu enfrentar a regra e o poder do tempo, que governa o passar do mundo, e ganhar. Ganhar poder, vontade e controlo sobre este. E por controlo soberano sobre o tempo, regressar minuto, hora e dia até ao dia e dias em que vivia de alma farta e aberta, aberta para ti, e ainda que fosse em mim este poder, não seria eu a mudar o passado que passou pelo tempo que criamos tu e eu. Não mudaria nem tempo nem segundo somente para que não fosse agora este sofrimento em mim porque se por não sofrer e padecer desta mágoa não pudesse conhecer o que senti… pelo que, juntos, sentimos e fizemos sentir no passado, não seria então em mim, nem gota de um mar por vontade de o alterar. Se por isso tiver de sofrer que sofra então a minha alma, sofra sem piedade porque não tenho arrependimento de te amar… nem de nada nem nunca, perante ti! Não tenho arrependimento nem na mais pequena veia minha por onde corre ainda o sangue teu e do teu amor e de todo o teu amar.